segunda-feira, 28 de junho de 2010

A Chegada de Mary.

Karina, Simone, Alex, Ricardo, David, Ilda, e Angélica eram amigos desde o primeiro período do pré-primário. Estudavam em uma renomada escola (O Instituto de Ensino Saint German) e viviam em uma cidade de médio porte chamada Paraibuna.

Karina era uma típica menina mimada que só falava ou escutava algo relacionado a ela mesmo. Não ligava muito para as idéias alheias, e o que mais gostava de fazer era dar opinião em tudo. Segundo os conceitos dela, as pessoas devem escutá-la e aceitar suas opiniões e conselhos, pois ela sempre “melhora” as coisas. Com seus longos cabelos negros, olhos azuis e seu belo corpo de bailarina, ela era sem sombra de dúvidas a garota mais desejada do colégio. Karina era mimada, bela e tinha tudo o que queria, mas era pouco inteligente, e ocasionalmente piadas relacionadas a “louras burras” eram contadas pelas suas arquiinimigas; quando isso acontecia, a casa caia, era barraco na certa.

Simone era, segundo as más línguas, “A Tapada”, pois como dizia sua mãe: vivia no mundo da lua. Falava coisas estranhas, que na hora pareciam não ter sentido algum, mas depois de um tempo, todos percebiam que o que ela havia dito era o mais apropriado para o momento. Simone era meio que vidente, previa as coisas, isso graças ao seu rápido raciocínio lógico. Poucas pessoas, além dos seus seis amigos, realmente gostavam dela, pois ela não tinha papas na língua, falava sempre o que vinha na cabeça, e não pensava duas vezes antes de repreender o erro de alguém (e gostava de fazer isso na cara da pessoa). Sua pele morena tinha um tom dourado que davam a ela um ar de sempre saudável, seu corpo arredondado era um pouco fora dos “padrões” das meninas d´’Saint German, mas nem por isso ela era menos bonita que as outras meninas, muito pelo contrário: muitos garotos a queriam, ela é que não dava bola a nenhum deles.

Alex era “O Galinha”. Já tinha ficado com pelo menos 60% das meninas do Saint German, e isso antes da oitava série terminar. O típico corpo de atleta, o cabelo castanho claro e o que as meninas chamavam de “olhar mortal” eram os seus principais atributos. Só que como pode se entender de seu apelido, ele era um galinha, gostava de ficar com varias garotas, e não podia ouvir falar em namoro que logo fugia.

Ricardo ou “Rick” era o menos “visto” do grupo. Falava pouco, era caprichoso e muito formal quando no meio de estranhos. Era só ganhar intimidades com ele que essa atitude mudava, ele passava a ser espontâneo, debochado, extrovertido, e às vezes até um pouco inconveniente. Ele era alto e forte, tinha cabelos negros, uma pele muito branca e olhos tão negros quanto os cabelos.

David era “O Gordim”. Com seu corpo cheio, louro cabelo espesso e altura incomum, ele impunha medo a qualquer um que tentasse brigar com ele ou com algum de seus amigos. Entre “Os Sete” ele era chamado de “Anjo”.

Ilda era “A Nerd”, e não tinha vergonha disso. Suas notas eram sempre as mais altas da turma, suas roupas as menos “transadas”, e seus cabelos os menos arrumados. Para a maioria das meninas ela era “A Desarrumada”, para os Sete ela era “A Catedrática”.

Angélica era a doidinha do grupo. Faladeira, espontânea, gentil, fofoqueira, engraçada e muito agitada, gostava mesmo é de uma boa confusão (o que lhe rendia o apelido de “Barraqueira”, ou “Ba” para os íntimos). Não era o que podia se chamar de gostosa, mas os garotos mais experientes percebiam que aquela garota sem graça um dia se tornaria uma baita d’uma mulher.

Esses eram os sete membros do grupo d’Os Sete. Estar entre eles era como andar com artistas de cinema. Fosse no pátio da escola, na pracinha, no shopping ou no cinema, estar com eles era como estar com a realeza. Se você se aproximasse deles, seria tratado com uma certa cortesia pelos outros estudantes.

Mas os Sete não eram a única “realeza” de Saint German, havia outros quatro grupos que também eram considerados como tal.

O grupo d’Os Atletas era formado por cinco rapazes do segundo grau. Nenhum deles muito inteligente, mas todos muito populares.

O grupo chamado “Madame” era formado por cinco garotas do terceiro ano científico (Mariana, Isabela, Débora, Alice, Mirian e Ester). Elas eram as estudantes mais bonitas da escola, e todas já haviam feito campanhas publicitárias para lojas e shoppings da cidade. Criadoras do clube “Top Girls”, elas simplesmente mandavam em 95% das estudantes de Saint German. O poder e a influência que elas tinham na escola era um pouco maior do que o poder e a influência d’Os Sete, e isso graças ao fato de todas elas terem muito dinheiro para gastar. Elas organizavam, as melhores festas. Era com elas que aconteciam as melhores coisas. Elas faziam as melhores viagens. Uma vez por ano elas iam juntas para Nova York, e voltavam de lá com o que há de mais top e recente no mundo da moda... e é claro, eram copiadas pela maioria das garotas.

Tabajar era um trio formado por três garotos imbecis (Diogo, Guliver e Otávio), que só eram respeitados porque gostavam de uma briga. Bater era com eles mesmo. Sempre metidos em confusão, eram sem sombra de dúvidas as figuras mais temidas da escola.

Os Filhos da Pastora eram três irmãos protestantes. Washington estava no terceiro ano científico, Wagner no primeiro ano, e Wesley na sétima série. Como eles eram filhos da pastora da igreja protestante mais importante da cidade, eles estavam sempre cercados pelos evangélicos mais ricos da escola.

Esses cinco grupos governavam o Instituto de Ensino Saint German, e tudo o que eles faziam influenciava em alguma coisa. Qualquer coisa que alguém desse grupo fizesse ou falasse virava assunto.

Nossa história começa numa segunda feira, oito de fevereiro, primeiro dia de aula.

Nos corredores de Saint German os alunos estavam eufóricos, conversavam empolgados sobre o que fizeram nas férias. Alguns riam alto, outros gesticulavam empolgados, todos falando muito alto. Na porta de cada sala havia um papel com a série, turma e nome dos alunos que estudariam naquela classe. Alguns alunos procuravam seus nomes nas portas, outros procuravam nomes de amigos, alguns rabiscavam nomes de outros alunos só para “sacanear”.

Como em todos os anos anteriores, Os Sete estavam na mesma sala. Agora alunos do primeiro ano científico, o status deles era um pouco maior de quando eram alunos do ginásio.

O grupo Tabajar estava na mesma sala d’Os Sete. Era a primeira vez que isso acontecia, e de cara muitos alunos percebiam que aquilo daria confusão.

Para melhorar a coisa, wesley também fora colocado naquela sala.

O Primeiro ano A, ou ÔPA, como seria conhecido, com esses onze alunos ilustres, prometia ser uma turma histórica. Mas outra surpresa estava guardada para os estudantes daquela sala, um décimo segundo estudante estava chegando. Era Mary. Foi só a linda garota colocar o pé direito na calçada da frente do colégio que todos os olhares, masculinos e femininos, focaram-se nela. Ela era alta, magra, muito clara, tinha olhos um pouco puxados de pupilas muito negras. Seu cabelo, um chanel repicado, muito preto, dava a ela um ar francês. Seu uniforme era uma atração à parte, era igual ao das outras meninas (saia azul marinho, camisa branca, sapato preto), mas tinha alguma coisa nele que o diferenciava. Ela andou, passou pelo portão e foi pelo caminho de cimento até a porta do prédio da escola. Quando entrou no hall de entrada, todos os alunos que ali estavam olharam para ela. Nas mãos uma enorme bolsa de grife. No cabelo óculos escuros. No jeito de andar uma superioridade maior do que a das Madames.

Mary subiu as escadas, e degrau por degrau sua postura era apreciada. No terceiro andar, onde estava a sala do ÔPA, ela viu o Ricardo pela primeira vez. Ele estava na porta da sala procurando o próprio nome quando ela chegou.

― Olá. ― Disse Mary.
― Oi. ― Respondeu Ricardo.
― Você viu se tem alguma Mary na lista? ― Perguntou ela.
― Tem sim. Mary Gimenez. É você?
― Euzinha mesmo. Prazer!
― Prazer. Meu nome é Ricardo. Meus amigos me chamam de Rick, se quiser pode me chamar assim também.
― Acho melhor não. ― disse Mary. ― Soa meio gay, não acha?

Ricardo arregalou os olhos. ― Nunca pensei nisso, mas você dizendo...

Mary sorriu e perguntou:

― Posso sentar-me ao seu lado?

Ricardo olhou para dentro da sala e viu seus seis amigos sentados da mesma forma que sempre se puseram na sala: bem longe da porta e da mesa do professor. ― Infelizmente não. Meu lugar está guardado e envolta estão todos os meus amigos. Mas tem uma cadeira vaga atrás da minha, pode se sentar ali.

Mary sorriu e seguiu Ricardo. Sentou-se na cadeira logo atrás da dele e colocou a bolsa sobre a mesa.

Karina e Simone, que conversavam sobre a grade de matérias, olharam para a novata com desconfiança. Alex, Ilda e Angélica, que riam de uma piada que David havia contado, só perceberam a presença da garota quando Ricardo chamou-os.

― Gente, essa é a Mary. Ela é novata aqui e vai ser da nossa sala esse ano. Mary, esse é o David, essa é a Angélica, Ilda, Alex, Simone e Karina.

Mary sorriu para cada um deles e disse:

― É um prazer conhecê-los. Espero que venhamos a nos dar bem.

Karina olhou para ela com cara de deboche e pensou: Para isso você vai ter que falar como pessoas normais. “Espero que venhamos a nos dar bem” não é algo que alguém normal diga, não aqui. E querendo saber a origem da garota karian perguntou:

― De onde você é? Seu sotaque é tão diferente!

― Nasci em Nova York, mas só vivi lá até meus dois anos de idade. Morei dos 3 aos sete anos em Londres, dos 7 aos 10 em Paris, dos 10 aos 12 em Lisboa, dos 12 aos 15 em Nova York, dos 15 aos 18 em Roma, e agora com 18 anos me mudei pra cá. ― Disse Mary. ― Então me desculpe se meu sotaque soar estranho a vocês.

Aquela tal de Mary mal havia chegado e já irritava Karina. Que garota mais convencida! Pensou Karina. Mal chegou e já está querendo esnobar desse jeito!

― Nossa! Então você é uma cidadã do mundo! ― Comentou Ricardo.

― O que seu pai é exatamente? ― Perguntou Ilda.

― Ano passado ele se tornou diplomata. Está morando em Paris. ― Disse Mary.

― E o que você está fazendo aqui em Paraibuna? ― Perguntou Simone. Esta cidade não esta a sua altura. Pensou.

― Minha mãe é natural daqui. Achei que seria bom morar no Brasil por alguns anos, conhecer a cultura e os costumes do povo do qual derivo. Vim para Paraibuna porque meus avós maternos moram aqui. Estou morando na casa deles. ― Respondeu Mary docemente.

― E esta gostando da cidade? ― Perguntou Karina.

― Sim. Já tinha vindo algumas vezes e gostado muito, mas nunca em período de aulas. Agora estou percebendo que essa escola, apesar do visual europeu, me parece bem americana. ― Respondeu a novata.

― Por que? ― Perguntou Ricardo.

― Me digam uma coisa: Aqui vocês se separam em grupinhos fechados? ― Mary perguntou em um tom que mostrava que ela tinha certeza que a resposta era sim.

Os Sete se olharam e riram. Mary ficou ali no meio deles, séria, esperando uma resposta.

― É o que mais tem aqui, Mary. ― Disse Simone. ― Grupinhos fechados. Nós sete somos um desses grupos.

― E quantos são? ― Perguntou a novata.

― Acho que são quatro grupos. ― Disse Karina. ― O nosso grupo se chama Os sete. Tem os Atletas, a Madame, o Tabajar e Os filhos da Pastora.

― Filhos da Pastora? Como eles são? ― Perguntou Mary.

― Você é protestante? ― Perguntou Karina.
― Não.
― Então esqueça eles. Nunca sequer falarão contigo se não for da igreja deles. ― Disse Karina.
― Nossa! ― Impressionou-se Mary. ― E esse outro grupo que se chama Madame?
― Eu acho que você gostaria de entrar nesse grupo. Todas as integrantes dele são bem parecidas com você: se vestem muito bem, tem dinheiro, são viajadas, super descoladas... ― Disse Karina.
Mary pareceu sem graça diante do comentário, então disse:

― Não gosto muito de pessoas assim, costumam ser chatas e ter regras estúpidas de convivência. Sou mais conviver com pessoas legais, que não tenham preconceitos raciais, religiosos nem econômicos.

― Nós somos assim. ― Disse Ricardo sorrindo. Logo em seguida ele sentiu alguém lhe dar um soco no ombro, era Simone que desaprovara o comentário dele.

Mary deu um sorriso e girou levemente o rosto, e foi ai que Os Sete perceberam pela primeira vez que havia algo de realmente excepcional naquela garota. Todos, inclusive Karina e Simone, que de cara detestaram Mary, sentiram uma enorme simpatia por ela diante daquele sorriso.

Mary tinha algo mágico dentro de si.

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